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Meditação: Sobre Relâmpagos na Escuridão

  • Foto do escritor: Breno Xis
    Breno Xis
  • 7 de nov. de 2024
  • 2 min de leitura

Atualizado: 8 de nov. de 2024

ondas da mente na forma de tomadas de consciência, aneis concêntricos
Fotografia tirada pelo autor durante sua estadia no Chagdud Gonpa Odsal Ling, em Cotia, SP.

Uma vez ganhei um aquário. Peixes dourados nadavam com neons, platis, ituís e limpa-vidros. Às vezes os peixes morriam.


Depois de limpar o aquário e remontá-lo permanecia fora do tempo, absorvido pelo universo na caixa de vidro. Do meu ponto de vista era um refúgio silencioso e vitalizante. Não sabia o que estava fazendo. Simplesmente escorregava nessa experiência de atenção não-elaborada. Era e continua sendo algo natural, isto é, que acontece apesar de mim.


Muitos anos se passaram e com a prática do treino da mente comecei a notar algumas dessas naturalidades presentes na imediaticidade da experiência comum: cognoscência, espontaneidade, senciência. O ponto aqui é que há já na experiência capacidades naturalmente presentes. Isso significa que não podem ser treinadas, mas apenas notadas. Todo o caminho gradual para a meditação parece ser desconstruir obstáculos e obscurecimentos para o reconhecimento dessas capacidades e qualidades presentes nas mentações e estados de consciência.


Uma dessas naturalidades é chamada pelos meditadores tibetanos de Ieshe (ye-shes), a capacidade (shes) cognitiva que opera antes do tempo (ye). Falando assim, parece algo sutil e místico, mas trata-se mesmo de algo que opera frequentemente na mente cotidiana e permite a experiência de reconhecimento e liberação dos fenômenos. Na prática de shamata, por exemplo, pode ser vislumbrada na capacidade de notar.


Uma coisa sobre "notar" é que ela não precisa que você note. Muitas vezes ocorre quando você está fixado no tempo, isto é nos fenômenos históricos e paisagens fictícias. No treino em shamata, treinamos notar quando a atenção foi capturada por um fenômeno e movida de seu objeto. Dado o nosso autocentramento, podemos pensar que nós notamos a "distração", mas uma maior intimidade com a mente e sua capacidade cognoscente eventualmente irá plantar uma certa dúvida que pode ser descrita nesses termos: "Se eu estava fixado naquele fenômeno, completamente abduzido pela formulação, pela imaginação, inconsciente de tudo o mais fora daquela paisagem ou acerca da natureza dela, que "relâmpago" de consciência foi aquele que rasgou a fixação, liberou a paisagem e devolveu-me ao frescor da experiência aberta imediata de não fixação? O que notou a distração?"


Uma vez que essa dúvida acontece, estamos farejando Ieshe, uma capacidade operativa que pode ser descrita como aquilo que permite que a mente se atualize, se refresque, se desfixe, conheça ao seu próprio espetáculo e conheça o conhecimento como fenômeno enquanto tal. Uma vez que a prática "limpa" os obscurecimentos que nos impedem de ver essa capacidade naturalmente presente, nossa prática é bastante facilitada e de certa forma reduzida a reconhecer de novo e de novo essa capacidade em meio a tudo o que aparece e desaparece.


Podemos agora nos perguntar: Quais outras capacidades estão presentes em todas as experiências comuns? O que elas dizem dessas experiências? Como elas informam nossas práticas? Se são naturalidades, ocorrendo espontaneamente em cada experiência, o que podemos praticar ou deixar de praticar para notá-las?



2 Comments

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Unknown member
Nov 08, 2024

Claro e afiado, sem mto reboco, gostei devéras ❤️‍🔥

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Breno Xis
Breno Xis
Nov 08, 2024
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Gustavo, obrigado por esse comentário. Serve-me como uma baliza para os próximos textos.🐚

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imagem do terapeuta breno xis, idealizador da autocuradoria
Breno Xis

Atendo pessoas interessadas em aplicar métodos clássicos de treino da mente para cultivar clareza, sensibilidade e conhecimento.

 

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