Tudo aquilo que surge no contexto da dualidade é uma espécie de violência, e os revolucionários que não conhecem a natureza da mente olham o mundo a partir de seus próprios egos. Ainda que possam ser egos bem intencionados, essa visão sempre é limitada. O ego é como um túnel, portanto a violência é inerente a ele. Então não há muita escapatória. Temos vários processos revolucionários que, uma vez sucedidos, ou seja, tiraram do poder aqueles grupos dominantes para estabelecer sua lógica - começam a se deteriorar por dentro: os amigos são mandados para longe, desaparecem de fotografias... Uma biografia das revoluções sem o capítulo “Traição” estará fundamentalmente incompleta.
É importante ter em mente que a violência é inerente ao mundo. Uma vez que se criou um mundo em uma mente e esse mundo é extrapolado desejosamente para “fora” - isto é, para o outro - a violência é inerente. Se esse fenômeno não é concebido e reconhecido pelo sistema, qualquer sistema, então isso implica naturalmente na falência da visão do sistema, ou seja, aquilo prevalece por algum tempo e erode. Nenhuma visão permanece porque nenhuma visão é completa, então toda visão é inerentemente violenta - mas atenção, malucos do relativismo, isso não significa que todas as visões são iguais na intensidade da violência. Existe um espectro e, em alguns casos, algumas visões são melhores que outras. E mesmo assim, todas as visões, mesmo as mais sublimes, são inerentemente violentas.
Um modo de falar sobre isso é trazer aquele mote de que “os fins justificam os meios”. Então temos essa visão (“idealismo”) de um reino de mil anos onde as pessoas estão todas assim ou assado. Mas a realidade transcende as visões, ela insiste em contradizer e romper com as visões. E as visões, mesmo as mais gloriosas, são insuficientes para deter aquilo que é não-visão. Então, o que as visões fazem? “Os fins justificam os meios”. E o que é isso? Código para a violência. Então, aquelas pessoas que ao menos questionam, por exemplo, contradições, vícios, limitações do sistema são vistas como pessoas ingratas - aí se manifesta essa violência inerente que é a subscrição fundamentalista a visões. Qualquer fixação a qualquer visão, por mais sublime que ela pretensamente seja, necessariamente provoca algum índice de violência.
Um último parágrafo para os malucos do relativismo. É um erro pensar que esse texto coloca todas as visões no mesmo cesto. Isso é de um simplismo profundo ou de uma desonestidade em relação à própria experiência. Se você está com um dente que precisa fazer um canal, você não busca a visão da tecnologia da informação. Você busca a visão da odontologia. Ninguém também nunca fez uma fritada de ovos substituindo os ovos por tiras de pneu. Na experiência algumas visões são mais apropriadas do que outras. E mesmo assim a subscrição a essas visões como extremos ou explicações todo-abrangentes é inerentemente violência. Lidem com isso.
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