Na meditação, aprende mais quem observa melhor. O objeto observado é indissociável da qualidade da observação. O mínimo necessário para ser capaz de observar algo é a ocorrência do corpo de cognoscência, atenção e memória. A elaboração conceitual, no ato de observação em si, não é exatamente necessária. Nesse sentido, falamos em atenção isolada; isolada de elaboração conceitual. A mente vê, mas está muda. Enxerga, mas está silente. (A elaboração conceitual, a título de contraste, fala, e muito, mas frequentemente está cega ou deslumbrada).
Sem atenção não é possível observar, uma vez que não há objeto selecionado para ser observado. Atenção, aqui, é quando a clareza se manifesta como foco. Sem foco não pode haver objeto de conhecimento. Já a atenção é impossível sem clareza, pois sem essa não possuiria a qualidade daquilo que conhece. Clareza é aquilo que conhece, isto é, a característica de cognoscência da mente.
Saber mais, na meditação, implica conhecer melhor a natureza do fenômeno, ou seja, do objeto apreendido pela atenção. Isso pode ser feito pela elaboração conceitual que pensa e repensa o objeto em busca de sua verdade: como vem a ser, como existe, suas dependências, características, contexto. E isso pode ser feito também através da clareza presente no fenômeno enquanto tal em sua pré-racionalidade (não confundir com irracionalidade). Nesse modo de conhecer, o objeto de conhecimento (ainda) não possui um nome, um sentido, um valor, sendo, meramente, uma aparência. Qual é a natureza de uma aparência?
É possível ver melhor pensando com mais rigor o fenômeno. A isso, popularmente, chamamos de filosofia. Filosofar seria, por essa definição, pensar e repensar o fenômeno. Esse modo de saber requer esforço, memória, associações, categorias conceituais, historicidade, a faca da análise, dentre outras faculdades e construtos complexos e interdependentes que são, via de regra, introduzidos e refinados através do processo de ensino-aprendizado formal, ainda que não exclusivamente.
Contudo, essa habilidade de filosofar como sendo a elaboração e re-elaboração, construção e desconstrução, das percepções e ditas verdades, não pode existir independentemente de qualidades não conceituais da mente, como clareza, atenção e sensibilidade. Assim, podemos dizer que o pensamento depende do não-pensamento; e que o saber depende do não-saber. O negativo e o positivo são indissociáveis: sem o silêncio entre as falas tudo seria uma cacofonia sem sentido; sem os espaços entre as notas musicais não haveria música. Por assim dizer, conhece melhor quem dá conta dos dois lados da moeda: ambos são da experiência humana e se informam mutuamente.
Neste ponto, uma pergunta pode ser instrutiva: Uma vez que o último pensamento passou e o próximo ainda não apareceu, o que há na mente? Em minha própria experiência e ouvindo relatos de pessoas que experimentaram essa pergunta, sei que uma resposta frequente é “nada”. “O que há na mente no momento quando o último pensamento passou e o próximo ainda não apareceu? Nada!”. Entretanto, quando o pensamento olha para o “espaço” entre os pensamentos e enxerga “nada” ali, isso diz mais da incapacidade do pensamento pensar sua própria ausência do que sobre a mente que “resta” ou permanece na ausência dele. Uma visão alternativa seria pensar “nada” como potencialidade. Nesse caso, o pensamento vê que, na ausência dele, tudo está ainda em aberto, indiferenciado e além dos extremos da existência e da inexistência.
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