A imagem do trovão na chuva!
Sento para prestar atenção. Que dificuldade! A imagem do trovão na chuva! A dificuldade inicial: avançar em meio à confusão em mente e através de seu reflexo nos corpos e ritos. O que é necessário para perseverar na prática? Concentração? Presença? Análise? Devoção? Qual meio é como uma espada? Qual recordação libera a energia da ciência estagnada?
Estou envelopado em meu próprio autocentramento. Minha consciência é um trovão de mundo na forma de pensamentos - muitos deles involuntários. Quem pensa os pensamentos que não são pensados por mim em minha própria mente? E para onde vão todas essas imagens e vozes quando desaparecem no espaço de uma mente sem fundo? Flagro-me em busca de respostas! Ah! Eis o não-fabricado! Um corpo sem órgãos, livre de metáforas.
"As dificuldades e obstáculos que surgem à mente são o caminho", ouvi de meus professores. "Nenhuma flor", ouvi de alguns, "jamais nasceu da pureza do espaço, mas em meio ao esterco, junto à terra!" Falam assim para me incitar a tomar a mente e as aparências como via de liberação. Se a lucidez parece frágil e a confusão parece forte recordo que é precisamente por não ser forte que a confusão pode ser vista e fulminada. É uma questão de reconhecer na confusão sua própria natureza de clareza.
A mente conceitual está amarrada à mente não-conceitual, como as nuvens estão amarradas ao céu. Os pensamentos celestes e mundanos fluem pelo corpo como um rio aéreo que desemboca na terra bem enraizada de uma mente inamovível, indissipável, que avança como o fogo brando refinando tudo o que toca em frescor. Quem sou eu para cozinhar o quê? Para que o esforço da transformação não se transforme em uma prisão incandescente, deixo na mão do espaço¹ a sabedoria do tempo de cozimento de cada fenômeno.
[Este texto aspira ser o primeiro de uma série que conecta a meditação, vista como treinamento da atenção e da mente, com a sabedoria atemporal do I Ching. Surgiu inspirado na pergunta "O que devo enfatizar em minha prática meditativa?", que fiz ao oráculo e para a qual obtive como resposta o Hexagrama 3.]
Nota
1. A metáfora do espaço é comum em muitos sistemas de meditação. No Budismo, ocorre na tradição Mahayana, associada, por exemplo, ao buda Vairochana, que representa a condição natural, não-fabricada conceitualmente, da consciência.
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